Peça em Dois Atos


PRIMEIRO ATO
...e Você

Entrei pelos portões principais. O colégio está apinhado de gente. Vieram todos para ver a exposição. Entrei pelo saguão. Vestido com uma calça social e camisa branca, coberto pelo meu terno inglês, de cor marrom.
O tom verde do azuleijo é intenso, alguns signos do zodíaco nas paredes, quem sabe o que queremos dizer com isso? Subi as escadas, passando a mão pela murada, e nela, alguns cravos, para evitar que os audazes estudantes de filosofia e teologia desçam de maneira mais rápida. Nunca imaginei encontrar isso naquele colégio.
A primeira parada, a sala do conselho episcopal. Piso de madeira maciça. Mesa belíssima com algumas cadeiras estofadas e muitos sofás. A poltrona de S. Santidade, guarnecida por um cordão. Um piano preto, sentindo aquele cheiro de mofo. Uma imagem de S. Bento, vestido de preto. E um armário, estranho.
Segui para o corredor, onde haveria de ter uma exposição mais exposição. Entrei na segunda sala. Os quadros eram simplórios, um todo vermelho, um todo branco, um todo cinza. Fiquei parado na janela, deixei o jornal no banco e debrucei-me no parapeito. Só duas janelas estreitas para todo um cômodo, foi quando Você se estendeu na janela ao meu lado. Linda cena.
Tá, achei obra do destino. Saí, e Você veio atrás. Você entrou em uma sala que eu não tive interesse. Continuei meu caminho, não sei porque, me detive, até ver que Você havia saído. Segui, e Você atráz. Subi as escadarias, e dei de cara com o pórtico da capela íntima. Local até então intocado.
Fui pela esquerda, e Você, pela direita. Analisei minimamente todos os vitrais, e Você, o mesmo do outro lado. Terminada a esquerda, quis ver a direita, e Você parado junto ao Altar.
O lado direito foi mais rápido, queria logo chegar próximo ao Altar. Mas o vitral falou mais alto, acabei me detendo em um deles. Foi quando Você passou, seu olhar penetrou o meu, e, se fosse faca, havia de ter me arrancado os olhos e deixado cego de desejo.
Agora, sou eu que segue Você. E deixo Você ir para todos os lugares, eu vou atrás.
Acabei desistindo da brincadeira, subi para o andar superior e vi a sala que fora fotografada pelo Estado. Mais uma vez, a janela, simples, pequena. Olhei para o Sta. Ifigênia, lá estava ele, amarelo como sempre. Fui saindo, e Você estava entrando.
Escolhi a janela mais próxima, fiquei um tempo, quando me virei, Você, na minha direção.
Errei, desviei, deveria ter ficado. Dito oi, olá, desejo-te. Qualquer coisa, menos ter desviado.
Bom, já fora a oportunidade. Decidi descer os três andares. Fui, como o modo, arrastando-me pelo canto, com a mão sobre a amurada, e Você, deslizando atrás de mim.
Te perdi de vista. Estava saindo, e Você passou rapidamente pela minha frente.

SEGUNDO ATO
Nossa dança

Estava eu do lado de fora. Você também. Ainda em terras do Estado do Vaticano, dentro das grades. Andei para frente da igreja, Você também veio. Saí do Vaticano, e fiquei bem no meio d'aquele estranho círculo. Você me olhando, e eu olhando Você, é como se estivéssemos perguntando, se realmente eu estava ali somente por tua causa.
Errei, deveria ter ido ao teu encontro.
Você virou as costas, e foi para a porta do colégio. Eu retornei até a porta da igreja. Parei, e te olhei. Você estava olhando para mim. Veio até mim.
Errei, entrei na igreja, deveria ter ficado.
Saí da igreja, Você estava lá fora me esperando.
Você não veio me dizer oi, olá, desejo-te.
Errei, deveria eu mesmo ter feito isso.
Você retornou para a porta do colégio, eu fiquei na porta da igreja. Você saiu do Vaticano, eu exitei.
Acabou seguindo seu caminho pelo Santa Ifigênia, decidi ir embora também.
O destino colocou o segurança na minha frente e fechou o portão, teria que ir para frente do colégio agora.
Acabei achando por maior coincidência.
Você estava no meio do Sta. Ifigênia, achei que tudo era sonho. Mas percebi que não, quando você parou e voltou seus olhos para a porta do colégio.
Acertei, acenei.
Você olhou confuso, talvez pensando a mesma coisa que eu. Será um sonho? Será comigo?
virou-se e foi embora.
Errei, não fui atrás.
A sua camiseta 'I love SP', foi a única coisa que me restou na memória.
O amor de um dia. O amor de uma exposição. O amor que S. Bento me trouxe, ele me levou.

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